novembro 07, 2016

UM POTIGUAR RIVAL DE SANTOS DUMONT


AUGUSTO SEVERO

Livro resgata a história do inventor potiguar que foi a Paris, em 1901,
participar de um concurso e morreu num desastre aéreo.
Político, jornalista, inventor e aeronauta brasileiro.

POTIGUAR AUGUSTO SEVERO FOI RIVAL DE SANTOS DUMONT

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DA AGÊNCIA ESTADO I FOTO: DIVULGAÇÃO

Uma tragédia chocou Paris em 1902. Às 5h40, a cidade ouviu uma explosão a cerca de 400 metros de altura. Em poucos segundos, escombros do dirigível Pax se chocaram contra a Avenue du Maine. No meio deles estava o corpo do primeiro mártir nacional da aeronáutica.

Parlamentar, republicano, abolicionista e defensor do divórcio, Augusto Severo de Albuquerque Maranhão foi o maior concorrente brasileiro de Alberto Santos Dumont na busca pela dirigibilidade aérea. Jornais da época publicavam manchetes do tipo “Severo x Santos”. Segundo especialistas, ele chegou a fazer algumas coisas até mais avançadas do que o pai da aviação. É justamente essa lacuna que Os Balões de Augusto Severo, de Rodrigo Moura Visoni (Editora Tamanduá_Arte), tenta suprir.

Com publicação prevista para 2017, o livro conta que Severo foi o único inventor brasileiro a testar um dirigível no País – o Bartholomeu de Gusmão, em 1894, no Rio. Também criou novos tipos de motores e, na política, aprovou projetos de interesse em seus três mandatos como deputado. Entre eles, um de saneamento da capital federal.

Nascido em 11 de janeiro de 1864, no município de Macaíba, ele começou a estudar Engenharia na Escola Politécnica do Rio aos 16 anos, mas desistiu do curso após ficar doente.

Em 1892, Severo pediu patente para a “direção dos balões”, dada em 4 de agosto e para o dirigível Bartholomeu de Gusmão, expedida em 8 de outubro. Em 27 de julho de 1899, patenteou o Pax, dirigível que acabaria com sua fortuna e sua vida.

Empolgado com o Prêmio Deutsch, que prometia 100 mil francos a quem em até meia hora voasse 11 km sem escalas, partindo e voltando ao mesmo ponto e contornando a Torre Eiffel no meio do percurso, Severo embarcou rumo à França em 18 de setembro de 1901 com a mulher, Natália, os filhos Augusto e Otávio e dois amigos.  Quando a encomenda foi entregue, em 1902, no entanto, todas as glórias já eram para seu concorrente brasileiro. Em 19 de outubro de 1901, Santos-Dumont havia completado sua prova do Prêmio Deutsch em meio a uma grande polêmica, causada pela falta de definição prévia do momento em que começava e terminava a prova. Após um debate que mobilizou os franceses, em 4 de novembro de 1901, por 13 votos a favor, 9 contra e 2 em branco, o Aeroclube da França decidiu dar o prêmio a Santos Dumont, que ganhou fama mundial e entrou para a história.
  
DIRIGÍVEIS MAIS AVANÇADOS QUE OS DE SANTOS DUMONT

“Os dirigíveis de Augusto Severo sempre foram mais avançados do que os de Santos Dumont. Quando fez o Bartholomeu de Gusmão em 1894, por exemplo, Santos-Dumont ainda não havia feito uma única ascensão em balão. Mas, por ter ganhado o disputado Prêmio Deutsch e se dedicado ao avião, Santos Dumont teve muito mais destaque na aeronáutica que Augusto Severo e acabou ofuscando o nome dele”, diz Visoni.

“Embora reconhecido internacionalmente pelos aperfeiçoamentos que introduziu nos dirigíveis, pouco se fala de Augusto Severo no Brasil. A figura de Santos Dumont eclipsou-o...”, confirma o físico e especialista em aviação Henrique Lins de Barros, na apresentação do livro.

Severo chegou a mandar carta ao presidente do Aeroclube da França protestando contra o encerramento do concurso. Disse que o balão com que pretendia disputar o Prêmio Deutsch estava quase pronto e o aeroclube não deveria fechar a porta a alguém vindo de tão longe. Afirmou ainda que, em sua visão, Santos Dumont não havia preenchido os requisitos do regulamento. Queixas em vão: em 8 de novembro de 1901, o prêmio foi entregue ao concorrente.

“Que fique claro que Severo não era um rival invejoso tentando prejudicar um compatriota, muito pelo contrário”, escreveu Visoni. “Prova disso é que, em 17 de julho de 1901, ele mesmo havia proposto e feito o Congresso brasileiro votar um prêmio de 100 contos de réis a Santos Dumont, como incentivo às experiências aerostáticas que fazia na França.”

Com 30 metros de comprimento, 20 de altura e 13 de diâmetro, o Pax ficou pronto em abril de 1902. Custou 150 mil francos, o dinheiro todo de Severo. Tinha dois motores a petróleo, sete hélices e levou cinco dias para ser inflado. Logo virou atração. Até a polícia teve de ser chamada para dar conta do grande número de curiosos.

TRAGÉDIA NO ÚLTIMO VOO

A tragédia do último vooApós dois testes no dirigível, Severo marcou um voo para as 5 horas do dia 12 de maio de 1902. Diante de cerca de 40 pessoas e com o balão já fora do hangar, ele assumiu a proa e o mecânico francês Georges Saché, a popa. Para carregar mais lastro, desistiu de levar o amigo Álvaro Pereira Reis.

O Pax era a concretização de um modelo que distinguiu Severo de outros inventores: o do dirigível semirrígido. “Eram aeronaves dotadas de estrutura parcial interna, que lhes permitiria atingir velocidades e alturas superiores aos dirigíveis flexíveis de Dumont. Ele [Dumont]sofreu vários acidentes ao longo da carreira justamente em razão da fragilidade de seus balões e por não haver adotado a disposição simétrica de forças proposta por Severo”, explisou o autor.

Ironicamente, porém, enquanto Dumont escapou praticamente ileso de todos os acidentes, Severo teve um destino trágico. Como descreveu o repórter Georges Caye, que acompanhou a ascensão do dirigível no Parque de Vaugirard, em Paris, “eram precisamente 5h25 quando o Pax largou o solo”. Após assistentes experimentarem cordas e hélices e fazerem os últimos testes, o político-aviador despediu-se dos amigos, mandou um beijo para a mulher e o filho mais velho e decolou.

Na época, os dirigíveis voavam com uma grande corda usada para ajudar nos movimentos e no equilíbrio do balão. “Quando o balão atingiu a extremidade da corda, o homem que a segurava reteve-a por um momento”, escreveu Caye. “Severo, sentindo-se detido, pensou que fosse insuficiente a força ascensional e lançou dois sacos de lastro, o que fez o balão elevar-se subitamente.” Logo se percebeu que algo não ia bem.

“O veículo não conseguia avançar contra o vento e os dois aeronautas começaram a fazer gestos largos um para o outro. A aeronave derivava, a cerca de 400 m de altitude, sobre a Avenue du Maine. Severo, que estava no motor da frente, deslocou-se para verificar o que se passava atrás. Isso fez o balão elevar a proa, sem, no entanto, tomar inclinação inquietante.

Logo depois, espectadores viram um clarão. Quase no mesmo instante, uma explosão tremenda foi ouvida. O balão havia se incendiado e estourado!”, descreve Visoni.

MORTE CAUSOU COMOÇÃO EM PARIS

A mulher de Severo, que seguia o voo de automóvel, deu um grito e desmaiou. A carcaça do dirigível tombou em poucos segundos. Severo caiu em pé, agarrado à quilha e sem queimaduras. O choque fez suas pernas entrarem no abdome. Seu relógio parou às 5h40. Já Saché foi completamente carbonizado. A Avenue du Maine,  anos depois, ganhou uma placa em francês com os dizeres: “Aqui morreram, vítimas da ciência, SEVERO, aeronauta brasileiro, e seu mecânico, o francês SACHET, na queda do dirigível Pax, em 12 de maio de 1902”.

Após ser levado a uma delegacia, o corpo de Severo foi transferido à casa da família, na Rue Gallilée, 63. Já o de Saché, que era solteiro e sem filhos, foi para a casa dos pais e enterrado em 15 de maio. No dia 30 de maio, o corpo do potiguar foi embarcado no paquete Brèsil. O enterro definitivo ocorreu em 18 de junho de 1902 no Cemitério São João Batista, no Rio, onde 30 anos depois também seria sepultado o corpo de Santos Dumont.


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