março 22, 2013

SEM JAMAIS PERDER A TERNURA

DANIELLE FILGUEIRA
 Delegada Adjunta da Deicor
Elas são lindas, jovens e poderosas... E andam armadas!
Cada vez mais assumem cargos de comando nas polícias brasileiras.
Na novela ‘Salve Jorge’, a delegada Helô, personagem da atriz 
Giovanna Antonelli, reflete um pouco essa nova realidade.
 O ambiente pode ser masculino, mas está mudando!
 Fotografia: Eduardo Maia/NJ 
 
 DELEGATAS

 Por
Talysson Moura  
 DO NOVO JORNAL

O sucesso da atriz Giovanna Antonelli na novela Salve Jorge tem sido tão grande que ela “roubou” a atenção dada pelos autores à protagonista Morena, vivida por Nanda Costa. O estilo “perua chique” da delegada - o celular com capa de “soco inglês”, muita pantalona, calças de corte reto e muitos acessórios - faz sucesso entre as mulheres.
 
Se Helô, vivida por Giovana Antonelli na novela Salve Jorge, existisse fora da ficção, ela certamente formaria neste time da nova safra de delegadas da vida real. Trabalhando no Rio Grande do Norte, seria colega de Danielle, Karen e Karla, mulheres de carne e osso que dão forma e graça à personagem de ficção mais comentada do folhetim das nove. Femininas, vaidosas e perspicazes, elas não abrem mão do salto alto nem da pistola calibre 40 na cintura. Com muito blush, batom, lápis de olhos e muita disposição, estão mudando a cara da Polícia Civil no Rio Grande do Norte.
 
Neste time de beldades (quase) anônimas, talvez seja dela o troféu “vaidade”. A delegada adjunta de Combate ao Crime Organizado, Danielle Filgueira, 29, antes de conversar com a reportagem, gastou pelos menos cinco minutos na frente do espelho. Produção impecável. Mas transformação mesmo acontece é quando ela se prepara para cair em campo. Prende o cabelo, troca a roupa justa por uma preta folgada, retira brincos e relógio, substitui o salto alto pelas botas táticas e não tem quem segure.

Foi assim, esquecendo a vaidade, que ela participou recentemente de um curso de técnicas e táticas policiais, considerado muito pesado para o dito “sexo frágil”. Ficou exposta a gás lacrimogêneo, spray de pimenta, fez patrulhamento, executou exercícios de força e, para sua surpresa, mesmo com a maioria esmagadora masculina, repetiu o desempenho que já tinha obtido no curso de formação geral da Polícia Civil: tirou o primeiro lugar entre todos os participantes, homens e mulheres.

Nas mãos, contrastando com as unhas muito bem feitas, carrega as marcas das flexões que fez no chão com punho cerrado, de igual para igual com os demais homens que participaram do curso. “Era no sol, sangrando, e eu lá. Igual a homem. Joelhinho no chão não tem, mãozinha aberta não tem”, contou orgulhosa.

Participar de cursos como este ajuda a jovem e bela delegada a se firmar num meio prioritariamente masculino. Ela foi a única mulher, em meio a 239 homens, a participar de um curso oferecido pela Swat com policiais do mundo inteiro. Danielle ressalta, contudo, que há muito respeito dos colegas. “É engraçado; eles me protegem. ‘Ali é nossa companheira de equipe e a gente está do lado dela. Ninguém mexa com ela’. Acho isso muito bacana”, reforçou.

A policial durona é casada. E por causa da profissão que toma boa parte do seu tempo, sofre cobranças do marido, dos familiares e dos amigos. “Mas com aquele jeitinho feminino, a gente consegue contornar ”, brincou. E ser policial, revela, não é para quem quer, mas para quem ama. Uma certeza que ela tem desde os nove anos de idade, quando trocava as brincadeiras com a Barbie pelo “polícia e ladrão” com os meninos na rua. Aos 10 anos de idade já atirava com o pai, caçando arribaçãs na zona rural de Pedro Avelino.

O lado policial, conta, nunca entrou em conflito com o lado vaidoso. Cada um no seu espaço. “O único momento em que eu desço do salto, feliz, é quando ponho minha bota tática”, afirmou. Por outro lado, é ‘masculinizada’ para realizar os treinamentos, mas não reclama: “depois volta tudo ao normal”.

Vaidosa assumida, ela conta que investe pesado para se manter bem. Não se priva de comprar uma maquiagem de marca ou um perfume francês. “Sou vaidosa ao extremo. De investir mesmo em mim. Trabalho para isso”, brincou. Para cuidar do corpo, ela faz muay tai três vezes por semana, além dos treinamentos diários na Deicor, de defesa pessoal e educação física.

 GIOVANNA ANTONELLI 
Personagem em 'Salve Jorge' inspira mulheres a entrar na polícia. 
Carreira exige diploma de Direito e concurso público
 Fotografia: Divulgação/Globo
 
PLANOS

Sua trajetória na Polícia Civil do RN começou pela Divisão de Polícia do Oeste (Depoe), ao lado do delegado Odilon Teodósio. Passou no concurso, logo após terminar o curso de Direito, na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Agora, sonha alto: quer ser a primeira mulher do grupo de operações especiais, uma equipe de elite que está sendo criada no estado.

No segundo dia de polícia, participou do caso Cinthia Lívia, menina assassinada por um vizinho em Tibau. No dia em que o assassino foi descoberto, ela teve que agir rápido para que a população não ateasse fogo na casa do criminoso com o filho dele, de apenas 14 anos, dentro do imóvel. Interviu pulando o muro da casa e assumindo a linha de frente contra o ataque.

Cair em campo, aliás, é o que a delegada Danielle mais gosta de fazer. Ela entende a importância do trabalho burocrático, mas gosta mesmo é de ação. “Eu boto uma pistola na cintura, boto uma arma longa e vou mesmo. E gosto de estar na primeira equipe, que é a equipe de entrada”, revelou.

Outro caso marcante para ela foi a operação Mal Assombro, que resultou na prisão do presidente da Câmara dos Vereadores de Assu, Odelmo de Moura Rodrigues. Danielle conta que teve que lidar com pessoas realmente muito perigosas e que tentaram intimidá-la.

Como meta, ela ainda espera mostrar que a polícia civil merece um crédito da sociedade. “Quero mostrar que a gente quer trabalhar, quer fazer, só precisa de investimento. Só precisa que o governo olhe um pouquinho para a gente, dê um pouquinho de estrutura”.

 KAREN LOPES
Delegada da Mulher
 Fotografia: Eduardo Maia/NJ

"NENHUM DELEGADO TEM A PRODUTIVIDADE QUE TENHO"

Confiante em seu trabalho, a delegada garante que é a policial que mais remete inquéritos de todo o estado. Só em um mês, são concluídos mais de 100 inquéritos. No ano passado, foram mais de 900. “Nenhum delegado tem a produtividade que eu tenho, de remeter tantos processos à justiça. De cumprir tantos procedimentos. Isso eu posso garantir. Eu aposto meu salário”, destacou.

Por dia, ela trabalha de dez a doze horas, o que consome também parte de sua vida pessoal. Nunca conseguiu trabalhar oito horas, como lhe é permitido. “Eu fiz disso aqui a minha vida”, contou a jovem delegada que é natural do Paraná. Hoje, ela mora com um noivo que veio de sua terra natal para acompanhá-la. O filho de três anos ficou com os avós. “Pela profissão, eu prefiro que esteja longe, não corra nenhum risco”.

Para exercer o ofício, a delegada reclama principalmente da falta de estrutura operacional. “Eu não vejo nossa profissão com glamour nenhum. Eu vejo com muito trabalho. Trabalho, trabalho, trabalho, e falta de estrutura. E sempre batendo nesta tecla, tentando melhorar as coisas. Eu me sinto indignada com as coisas, quero mudar, mas não sei. Já é assim há tanto tempo... e todo mundo empurrando com a barriga”, lamentou.

Nunca, reforçou, a Delegacia da Mulher esteve com apenas um delegado no comando. A jovem, de cabelos longos e claros, está substituindo sozinha outros três colegas. Antes de ser designada para o posto que ocupa atualmente, ela ficou à frente da delegacia de Caraúbas, no oeste potiguar, e outras cinco cidades.

Manter a vaidade é algo que ela não abre mão. Apesar de não viver em salões de beleza, mantém unhas e cabelos sempre impecáveis. E depois que foi para a Delegacia da Mulher, passou a se maquiar um pouco mais. Nos pés, sempre um salto alto, que destaca os seus quase 1,70 de altura.

Sustentar a feminilidade e doçura, sem abrir mão da firmeza, é encarado como um desafio. “A polícia endurece as pessoas. Sinto muito isso de muitos delegados antigos, que são duros mesmo. Eu não quero que isso aconteça”, destacou. “Até pelo tipo de trabalho que eu tenho, que é mais de atendimento ao público, com mulheres vitimizadas”, completou.

CARLA REGO
Delegada da Dehom (Homicídios)
 Fotografia: Eduardo Maia/NJ

“ANTES DE SERMOS DELEGADAS, SOMOS MULHERES” 

A vontade de ingressar na Polícia Civil, contou, surgiu ainda na faculdade de Direito, concluída na Universidade Federal do Rio Grande do Norte. O que chamou a atenção da Karla universitária foi a dinamicidade do trabalho, segundo ela, pouco presente nas demais carreiras jurídicas. “O dia a dia é bem corrido. Todo dia é uma emoção diferente. Aqui, a gente não tem rotina”.

Antes mesmo de terminar a faculdade ela começou a fazer cursinhos preparatórios. A meta inicial era a Polícia Federal. Na época havia uma expectativa de que fosse lançado um edital pra concurso, o que não ocorreu até hoje. Antes, porém, surgiu o concurso para a Polícia Civil na Paraíba e no RN. “Eu estudei com muito afinco durante três ou quatro meses. Dedicação exclusiva, porque é um concurso muito difícil. E tive a sorte de passar aqui e na Paraíba”, contou.

Em João Pessoa, foi delegada da Mulher. Ela conta que ser delegada não é um trabalho fácil, assim como de toda a polícia. Karla ressalta que é um ofício em que é necessário pensar rápido e em que há um estresse enorme por se tratar, sempre, de um momento muito delicado tanto para os familiares das vítimas quanto para os próprios suspeitos.

Na delegacia, onde fica a maior parte do tempo, tenta estar vestida sempre à altura do cargo, mas não se vê escrava da moda. Até porque não pode aderir aos decotes nem usar roupas curtas. Tem que estar sempre muito bem coberta, já que recebe suspeitos, representantes do Ministério Público e até presos.

Na delegacia, ela destaca que o caso de maior relevância já desvendado por sua equipe foi o assassinato do sargento da Polícia Militar do Rio Grande do Norte, Haroldo Lasmar Alves Cardoso, ocorrido na manhã do dia 24 de fevereiro de 2012.

Assim como as outras delegadas, não reclama de assédio nenhum por parte dos colegas de profissão. Pelo contrário, sente que eles evitam assuntos muito masculinos e ficam até constrangidos quando soltam alguns palavrões na sua frente.

  SHEILA DE FREITAS
Primeira mulher a comandar a Delegacia 
Especializada de Combate ao Crime Organizado
  Fotografia: Eduardo Maia/NJ

Solteira, a delegada confidencia que a profissão de certa forma intimida alguns homens, assim como as demais profissões em que as mulheres estão no comando, mas ela reage a isso com tranquilidade.

As características femininas, revela, ajudam na investigação. A perseverança, a curiosidade e determinação das mulheres já haviam quebrado a resistência masculina antes de sua entrada na polícia, com a chegada de outro time de mulheres, com Margareth Gondim, eternizada na Delegacia da Mulher, e Maria do Carmo. “Elas já tinham aberto as portas para a gente, tinham vencido essa barreira. E com o sucesso delas, foi possível que a gente fosse melhor aceita”, analisa.

A delegada é casada e tem três filhos. A rotina na polícia, para ela, atrapalha muito a vida pessoal, já que apesar de ter horas determinadas, sempre acaba havendo uma sobrecarga maior, por causa das necessidades que vão surgindo.

Com relação à vaidade, conta que não tem restado muito tempo para se dedicar aos cuidados. Ainda assim, estava impecavelmente vestida, cabelo arrumado, unhas feitas - com a unha do dedo anelar pintada de dourado -, blusa bem estampada e de salto alto. Para justificar a produção, modestamente, revelou que vinha de uma reunião com o secretário de segurança.

Para tudo o que se propôs fazer sempre fez com dedicação e amor, ressalta Sheila, o que para ela é o segredo do trabalho bem feito. Dos casos mais marcantes, ela lista o sequestro do jovem Popó Porcino, desvendado em pouco tempo e com desfecho muito positivo no ano passado. Outros casos que ganharam muita repercussão foram o estupro de várias jovens em uma granja e o assassinato de um pastor em uma duna. Para as novatas, ela dá apenas um conselho. “Polícia não é para quem quer. É para quem gosta”.

...fonte...
www.novojornal.jor.br

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