janeiro 14, 2014

MOACY CIRNE: UM HOMEM MÚLTIPLO

MOACY CIRNE
Escritor, professor, pesquisador e tricolor de coração
Considerado o maior estudioso brasileiro das histórias em quadrinhos
Moacy Cirne detinha um olhar circular e atento,
que poucos possuíam neste país.
Fotografia: João Maria Alves

UM HOMEM MÚLTIPLO

Por

Yuno Silva
repórter
 Cinthia Lopes
editora
TRIBUNA DO NORTE

Moacy Cirne era como uma ponte: uma ponte de mão dupla entre texto e imagem, passado e presente; elo de ligação entre o modernismo, a vanguarda e a tal contemporaneidade. Ou ainda um atalho entre o Seridó, Natal, Rio de Janeiro e o resto do planeta. Crítico, ensaísta e poeta. Passional e radical, teórico e antiacadêmico, Cirne transitava com desenvoltura pelos campos do cinema, das artes visuais e dos quadrinhos. Pioneiro no estudo da arte sequencial no Brasil, membro da primeira turma do Cineclube Tirol e fundador do movimento Poema/Processo, foi seridoense incurável de corpo e alma que não se cansava em citar, comentar e relembrar detalhes sobre suas primeiras descobertas lá para as bandas de Caicó. 

Na verdade, por maior que seja o esforço, irão faltar palavras e adjetivos para alcançar a dimensão de sua personalidade inquieta e universal: Moacy Cirne encantou-se este sábado (11), por volta das 13h, quando sofreu uma parada cardíaca após procedimentos cirúrgicos no fígado. Sua saúde andava abalada, tratava de uma cirrose hepática provocada por resquícios de uma Hepatite tipo C de tempos atrás, agravada pelo surgimento de tumores no órgão. Seu corpo foi sepultado no domingo (12), em Caicó, conforme seu pedido.

A viúva Fátima Arruda, que esteve os últimos 19 anos ao lado do poeta, informou que Moacy fez cirurgia na quarta, teve a parada cardíaca na sexta e faleceu no sábado. “Por enquanto vamos acompanhar as homenagens, depois pensamos em publicar algum material inédito”, disse Fátima, adiantando que Cirne vinha pesquisando várias versões de traduções do Velho Testamento da Bíblia. “Ele estava na angústia de concluir essa pesquisa”, destacou. E confessa quando questionada sobre os amores nutridos pelo poeta: “Seu amor pelo Fluminense era intangível, não dava pra competir!”. Cirne deixa duas filhas, Ana Morena, 27, e Isadora, 23, do primeiro casamento, que moram no RJ.

HQ, CINEMA E POEMA/PROCESSO

Autor de quase três dezenas de livros, Cirne carimbou seu nome para a posteridade logo na estreia com “Bum! A explosão criativa dos quadrinhos” (Editora Vozes), de 1970, obra definitiva para quem pretende ter uma visão crítica e fundamentada sobre o assunto. E vieram outros, pelo menos mais uns oito livros orbitando em torno das HQs, sedimentando o trabalho de Moacy como a principal pesquisa sobre a área.

“Eu era conhecido como ‘o menino do gibi’. Toda quinta-feira, ‘seu’ Benedito vendia na calçada de sua casa as revistas em quadrinhos que comprava em Recife. Ele tinha um caminhão e trazia as coisas para vender em Caicó, inclusive os gibis. Às vezes só chegava na sexta de manhã. Eu ficava lá, de plantão, esperando. Comecei a comprar essas revistas aos sete ou oito anos”, declarou o poeta/processo em entrevista concedida ao jornalista potiguar (radicado em Brasília) Roberto Homem, para o blog Superpauta, no início do mês de dezembro do ano passado.

Sobre o Poema/Processo, Moacy Cirne lembrou na mêsma entrevista que no final da década de 1960 “para aparecer no meio intelectual da cidade, era comum ser apadrinhado por Câmara Cascudo. Nós não tínhamos nada contra Cascudo, apenas nos propusemos a fazer outra coisa”.

VANGUARDA

“Em 1968 houve um debate cultural por aqui, no Sesc, que considero a chegada das vanguardas a Natal. Moacy Cirne estava lá, com Dailor Varela, representando o Poema/Processo”, lembra o jornalista Vicente Serejo. “Era como se fosse a retomada do modernismo, mas na vanguarda, como uma tomada de posição”, conceitua. Serejo conta que Cirne era “metódico, grande leitor e o mais culto dessa turma toda”, e que quando se muda para o Rio de Janeiro passa a alimentar o movimento local com novas ideias.

“Da minha geração, ele foi fundamental. Provavelmente o mais importante. Sempre trazia uma carga de conhecimento do Rio cheia de novidades. Moacy se insere entre os criadores e inventores de novas linguagens, tinha uma visão muito ampla do mundo”, disse o artista visual e poeta/processo Falves Silva, 70, parceiro de Cirne. “Assinei seis ou sete capas de livros dele”.

“Dizer que ele foi o guru, o cabeção do Poema/Processo, é chover no molhado”, garante Abimael Silva, do Sebo Vermelho.

Para o jornalista e crítico literário Nelson Patriota, Moacy Cirne “permaneceu um rebelde, queria sempre inovar. Admiro muito essa faceta inquieta dele, que não se dava por satisfeito com nada e tinha certeza que a arte tinha sempre mais a oferecer”.

BASES TEÓRICAS E HQ

Para Dácio Galvão, poeta, ensaísta, presidente da Fundação Capitania das Artes e amigo pessoal de Moacy, “foi ele que inaugurou o conceito teórico de literatura aqui no RN com base em argumentos científicos. Moacy deixa a subjetividade de lado e provoca um olhar diferenciado, inclusive na área de quadrinhos, quando passa a analisar não apenas o textual mas também as imagens.

Galvão acredita que boa parte da literatura do seridoense é fundamental, como o livro “Vanguarda: um projeto semiológico”. “O livro revela não só a base do Poema/Processo, como revisita Jorge Fernandes. Ele deixa um legado que não admite concessões”.

“Era meu melhor amigo, meu irmão mais velho, meu pai literário. Nosso consolo é sua obra, referência pra qualquer pessoa em qualquer lugar do país”, garante o sebista e editor Abimael Silva, do Sebo Vermelho, responsável pelo lançamento de doze livros de Moacy Cirne.

BÍBLIA

Abimael Silva contou que Moacy Cirne deixou um estudo inédito chamado “Penúltimas leituras seridoenses”, mas que antes de qualquer movimento irá consultar a família. “Sei que ele também trabalhava em uma releitura do Velho Testamento da Bíblia. Vinha pesquisando isso há mais de dez anos”, revela. De fato, da última vez que Dácio esteve na casa de Cirne, o poeta estava envolvido com oito traduções diferentes da Bíblia. “Ele vinha comparando traduções da Bíblia, acredito que para uma futura publicação”, reforçou Nelson Patriota.

DICOTOMIA

“Fomos parceiros, tínhamos em comum a identificação e as  diferenças de ideias. Entre convergências e divergências tivemos uma amizade muito intensa”, disse o jornalista e poeta Jarbas Martins, que conheceu Moacy logo que veio de Caicó morar em Natal. “Ele tinha uns 17 anos, falávamos sobre tudo, cinema,  política, era uma pessoa passional e radical em tudo o que fazia, contrário a toda e qualquer forma de regras burguesas.

...fonte...
www.tribunadonorte.com.br


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