O tempo da maturidade artística chegou para Khrystal Ela está pronta para iniciar nova temporada de vida e de arte O novo disco 'Dois tempos' é musicalmente mais refinado
Fotografia: Giovanna Hackradt
UMA CANTORA DE OPINIÃO
Por
Tádzio França
O tempo da maturidade artística chegou para Khrystal. Como em todo processo de amadurecimento, primeiro é preciso marcar território, dizer a que veio e provar algo. A cantora natalense considera que já atravessou essa fase com o elogiado "Coisa de preto", de 2007, e está pronta para iniciar nova temporada de vida e de arte com "Dois tempos", o segundo disco, cujo lançamento ocorreu nesta sexta-feira (07/09), no Teatro Alberto Maranhão, em Natal/RN.
A apresentação contou com a participação de Eduardo Taufic e de Cicinho do Rapique, sambista bamba das Rocas. A entrada ao espetáculo de estreia, dando início a turnê do show "Dois Tempos", foi uma lata de leite em pó, trocada na bilheteria do teatro pelo ingresso, sendo a arrecadação revertida para o hospital infantil Varela Santiago.
O trabalho como compositora é, segundo Khrystal, o "detalhe" que mais diferencia "Dois tempos" do disco anterior. Das treze canções do álbum, dez levam a assinatura da cantora. "Representou muito pra mim abrir meu lado de compositora. No outro disco, ficava me comparando com os outros compositores e me inibia. Mas consegui resolver essa insegurança, até mesmo pelo tempo que levamos para fazer o disco, ao longo de quatro anos", reflete. "Dois tempos" também avança pela temática. "O outro disco fincava o pé no regionalismo, enquanto o novo é sobre o cotidiano, as coisas do dia a dia. É um disco planetário", considera.
O novo disco, além de firmar Khrystal como compositora, também pretende desfazer alguns rótulos atribuídos a ela. "As pessoas me chamavam de coquista e eu ficava com raiva, apesar de saber que não era por mal", diz ela, se referindo ao repertório de "Coisa de preto", bastante focado nos cocos. "O coco foi um elemento que usei para me diferenciar das outras cantoras de MPB, e também para evidenciar o único ritmo legitimamente potiguar. Mas nunca tive a pretensão de ser uma coquista. O 'Coisa de preto' tinha aquela coisa de afirmar a nordestinidade, algo que já fiz, mas não quis repetir no novo trabalho", explica. O CD “Dois tempos” é formado por 13 canções, e muitas delas foram cantadas em parceria com outros artistas. “Tem Simona, Talma, Ricardo Baya, todos artistas de primeira qualidade”, enfatizou a cantora.
"A música de Khrystal transita entre o regional, o samba,
a MPB e o rock com desenvoltura e rapidez"
Fotografia: Alec Luan
a MPB e o rock com desenvoltura e rapidez"
Fotografia: Alec Luan
MUSICALIDADE REFINADA
A leveza é uma característica que Khrystal quis ressaltar no novo disco. "O 'Dois tempos' é musicalmente mais refinado. O anterior tinha algo mais pesado, uma atitude quase rock 'n roll, porque eu sempre tive um sentimento de revolta que gostava de expressar. Mas agora estou mais confortável, leve, de mente aberta, e o disco reflete isso", explica. Esse processo também incluiu a convivência maior com outros artistas e novos ambientes. "Graças ao Luiz Gadelha e a Simona Talma, por exemplo, passei a ouvir muita gente diferente, que eu nem sabia que existia, e isso foi me influenciando", diz.
"Dois tempos", que foi produzido por Khrystal e Ricardo Baya, circula musicalmente entre o samba e o forró. A cantora afirma que isso aponta para outras áreas de sua bagagem musical. "O samba está na minha vida desde criança. Meu pai, que era um boêmio nato, ateu, era vidrado em música, especialmente samba. Já a minha mãe, religiosa, ouvia mais a MPB convencional. No começo da carreia eu cantava 'chiando', como as moças de fora. Até que deixei disso e o Nordeste entrou de vez na minha música. Pra mim, isso foi uma catarse", afirma. Khrystal também assumiu a paixão pelas cantoras americanas - que ela costumava criticar em seus shows.
"Eu tinha uma revolta infantil contra a música estrangeira, costumava fazer discurso revoltadinho no palco, mas também parei com isso", afirma. Khrystal conta que gravou "Dois tempos" sob a influência de divas do jazz como Ella Fitzgerald, Billie Holiday e Nina Simone, ao lado de cantoras que trabalham bem melodias ao violão, como Adriana Calcanhoto, Nara Leão, Célia Vaz, Valéria Oliveira, e sua eterna musa Elis Regina. Ela considera que o novo disco é musicalmente mais refinado. "Boa parte disso devo também aos pianos do Eduardo Taufic, que deu esse tom classudo ao repertório", ressalta.
"Não tenho tempo pra ser estrela"
Fotografia: Júnior Santos
SOBRE PRECONCEITOS E ESTRELISMO
A liberdade que "Dois tempos" deu a Khrystal permitiu que ela abordasse variados assuntos de seu cotidiano. O primeiro foi o preconceito dividido geograficamente, visto em "Zona norte, zona sul", a primeira música de trabalho, e que já rendeu um vídeo. "Nasci e me criei na zona norte, todo mundo sabe que há preconceito. Fiz essa música com o Ricardo Baya, que também tem essa coisa do gueto, como eu. Foi nossa forma de dar um tapinha na cara dos hipócritas", comenta. Outra que ela cita é "Bem ou mal", parceria com Luiz Gadelha, uma canção sobre aceitar as coisas como elas são. "Quando você se aceita, tudo é possível. Pra mim, a liberdade é cantar um blues, um forró, um rock , o que eu quiser", explica.
A canção "Dois tempos" foi a última a entrar no disco, segundo Khrystal, e é a mais emblemática na intenção que ela tem de "desglamourizar" a profissão de cantora. "O Brasil é louco por seus artistas, e acontece de algumas vezes colocar as cantoras num pedestal. Sempre detestei essa imagem de diva intocável, de cantoras que se acham seres divinos. Por isso o disco fala tanto sobre as durezas do meio artístico, que na verdade não tem esse glamour todo que o povo acha. Não tenho tempo pra ser estrela, como diz a música", conclui.
Tádzio França
www.tribunadonorte.com.br
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