maio 29, 2014

ANTES QUE A MEMÓRIA SE APAGUE

JOÃO MAURÍCIO FERNANDES DE MIRANDA
Em seu novo livro, “Natal Foto-Gráfico - Do Passado ao Presente”, 
o arquiteto confronta o espaço urbano do final do século 19
 com  o que conhecemos hoje e prova que o cenário vem 
passando por sérias - e grotescas - modificações. 
Fotografia: Divulgação

 UMA NATAL SEM MEMÓRIA E INSEGURA

Em Natal, são várias as obras assinadas por João Maurício. Entre elas, destacam-se o edifício Barão do Rio Branco, a agência da Caixa Econômica Federal da Ribeira, o prédio do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) na Cidade Alta, a capela da UFRN (sua preferida), além dos projetos de reconstrução da Capitania das Artes e do Centro de Turismo.

Ainda é importante ressaltar que partiu do arquiteto a solicitação do tombamento da casa que hoje abriga o Museu Café Filho, na Cidade Alta. Toda a parte interna do casario, de 1820, ia ser modificada e ele impediu. Apesar dos 80 anos, João Maurício não para. Sua inquietude o levou a comprar um teclado (que está aprendendo a tocar) e, alguns anos antes, a escrever o livro “...antes que a memória se apague”. A publicação conta sua história de vida, que está muito misturada à história de Natal.  
 
A paisagem modificada de Natal, onde João Maurício Fernandes de Miranda nasceu no ano de 1933, não é a única coisa que o entristece. Ele lamenta também a capital potiguar ter se tornado tão violenta. “Fiz essas últimas fotos há dez anos. Se fosse hoje, não faria. Não é só o receio de ter o equipamento roubado. É de não voltar”.
 
Ele se formou no Rio de Janeiro em 1971 e, de volta a Natal, a convite de Aluízio Alves, montou o primeiro escritório de arquitetura da cidade. Foi também um dos fundadores da UFRN e do curso de Arquitetura da instituição, do qual foi professor até 1993, quando se aposentou.

Fundador da faculdade de arquitetura e autor de vários projetos arquitetônicos, 
ele  lamenta  a falta de  memória e ação dos natalenses.
Fotografia: Magnus Nascimento

 ANTES QUE A MEMÓRIA SE APAGUE

Por
Itaércio Porpino
TRIBUNA DO NORTE

Pergunte ao arquiteto João Maurício Fernandes de Miranda, de 80 anos, e você vai saber, em detalhes, o quanto e como Natal vem se transformando ao longo do tempo, com seus locais e construções históricas sendo bizarramente modificados e, muitas vezes, destruídos. Mais que dizer, ele vai mostrar.

Em seu novo livro, “Natal Foto-Gráfico - Do Passado ao Presente”, o arquiteto confronta o espaço urbano do final do século 19 com o que conhecemos hoje (será que conhecemos mesmo?) e prova que o cenário vem passando por sérias - e grotescas - modificações. 

A publicação, que será lançada nesta sexta-feira (30), a partir das 19h, na Capitania das Artes, não é  bem um livro-denúncia, mas, em suas 222 páginas, não deixa qualquer dúvida quanto à contínua agressão à memória da cidade.

“Olhando o livro, a pessoa conclui que muita coisa que tinha que ser preservada não foi. Isso é apagar a memória”, diz João Maurício, que arremata na apresentação da obra: “Comparar, por meio de fotos, as transformações por que vem passando a cidade, constatar onde era ou fora este ou aquele prédio, monumento, praça, jardim ou logradouro público, denunciar a destruição desta ou daquela obra do passado, é minha contribuição para a história”.  

“Natal Foto-Gráfico: Do Passado ao Presente” é uma edição revista e ampliada de “380 Anos de História Foto-Gráfica da Cidade de Natal”, publicada em 1979 após um difícil e minucioso trabalho de seis anos. Tudo partiu das fotografias feitas pelo jornalista e juiz caicoense Manuel Dantas (autor da famosa conferência Natal Daqui a Cinquenta Anos, proferida em 21 de março de 1909). Ele morreu em 1924 e deixou um valiosíssimo acervo de imagens da Natal do final do século 19, ao qual João Maurício teve acesso.

“É um acervo antigo. E na época que sua família me cedeu, ninguém conhecia. São registros da cidade, das autoridades, das pessoas simples, festas, costumes, vestuário e imobiliário. Eu escolhi o cenário urbano”, conta o arquiteto, que com as fotos velhas, em preto-e-branco, foi capaz de identificar os lugares e visitá-los na segunda metade dos anos 70 para fotografar e fazer a comparação.   

João Maurício lembra que teve muito problema para localizar alguns ambientes, tamanha a descaracterização/ destruição deles. Já para fazer a nova edição do livro, não existiu essa dificuldade. “Como já havia ido uma vez, já sabia onde encontrá-los”. 

Vários cenários

“Natal Foto-Gráfico: Do Passado ao Presente” sai 25 anos depois da primeira edição, em um formato menor (mais fácil de manusear) e com novas fotografias feitas pelo arquiteto em 2004. Segundo ele, da primeira para a segunda versão, teve lugares que já foram modificados duas a três vezes.

Os originais do livro estão prontos há uma década, mas só agora ele está sendo lançado, com tiragem limitada de 250 exemplares, impressos na gráfica do Senado Federal. O motivo de tanta espera foi um só: “Dificuldade para conseguir  apoio”, diz, mas sem tom de queixa, como alguém já acostumado à burocracia e  promessas não cumpridas, principalmente por parte do poder público.    

Só para ilustrar, em 1999, ano em que Natal comemorou 400 anos, o arquiteto foi convidado para expôr na Capitania das Artes as réplicas de caravelas portuguesas que ele mesmo fez, a partir de plantas originais, conseguidas em Lisboa, e na ocasião os políticos presentes prometeram-lhe que iriam transformar um dos prédios que abrigaram as oficinas de manutenção da antiga ferrovia, na Ribeira, no Museu da Cidade. Passados 14 anos, nada foi feito. A construção está se acabando.    

Já as caravelas em miniatura ganharam um museu (o Museu das Naus) no Iate Clube, mas o espaço não chegou a durar um ano. “Fechei porque me forçaram a isso. Não recebi incentivo. Pelo contrário”, conta João Maurício.

IMAGENS QUE FALAM

Antes: um belo coreto... 

Demoliram o coreto de graciosa leveza em ferro batido, possivelmente importado, assente sobre embasamento com porão para guarda de material de limpeza urbana. 

Depois ...pelourinho de canhões

Substituíram o gracioso coreto por esta agressiva base com quatro canhões e o pelourinho. Um fato pitoresco aconteceu. Nos anos 50, Natal contava com uma guarda noturna mantida pela Prefeitura. Certa manhã, quando o dia clareou, estava amarrado no pelourinho, ao centro dos canhões, um guarda completamente nu, de costas para a Matriz, escandalizando as beatas que chegavam para a missa. Uma brincadeira de estudantes.

A capela que deixou de ser barroca

Para o catolicismo, tudo é sagrado, menos o direito de respeitar e preservar os valores culturais da arquitetura brasileira. Mais uma vez se destrói um dos mais puros e belos exemplares de nossa arquitetura religiosa barroca, a antiga Capela do Bom Jesus na Ribeira, para transformá-lo num falso gótico.

Seria um museu

Este e outros prédios foram construídos em 1916 para abrigarem as oficinas de manutenção da ferrovia Sampaio Correira, onde hoje funciona o Denocs. Tentamos restaurá-lo para ser um museu para a cidade. Por quatro anos esperamos alguma decisão. Hoje, encontra-se o prédio em estado de desmanche e abandono pelos responsáveis ou irresponsáveis pelo patrimônio público.

Destruindo Newton Navarro

O prefeito Djalma Maranhão construiu um pavilhão e denominou de Galeria de Arte Cândido Portinari. Tinha como pilares uma cópia do Palácio da Alvorada. Brasília estava na moda. Na fachada norte, havia um painel de Newton Navarro. Foi demolido no período militar.

Avenida Rio Branco

Dois momentos da avenida Rio Branco em 1979 e em 1981, à esquerda das lojas Americanas e o Banco do Brasil à direita. (fotos: João Maurício)

...fonte...
www.tribunadonorte.com.br

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